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"Elefante": um espetáculo que alcança seu público

Olhar Teatral, Por Paty Lopes, Crítica Teatral

Em 17/07/2023 às 21:23:55

Tenho observado os espetáculos infantis e noto como alguns deles estão distantes de uma linguagem apropriada para o público-alvo. Espetáculos longos, com textos complexos e daí perdem-se as características do que deveria ser uma obra infantil. Isso é ruim demais, porque perdemos a plateia.

É necessário entender do público, seja esse infantil ou adulto, principalmente um cuidado expressivo com o texto. A dramaturgia precisa ser esclarecedora e, no caso do espetáculo infantil, é preciso entender a linguagem e o entendimento dos pequenos. O teatro é feito para o público e não para o artista no palco! Esse devaneio precisa acabar. Textos confusos não falam, não são objetivos e nos perdemos, perdendo a oportunidade de educar, tirar uma venda dos nossos olhos, abrindo assim nossos caminhos para a vida.

E o espetáculo "Elefante"?

Ah! O Elefante desse espetáculo não incomoda muita gente, ele acolhe e encanta muita gente!

Que maravilha a concepção artística do artista Flávio Souza, que responde por quase todas as rubricas.

"Buscamos uma arte feita para todos, inclusiva, acessível e decolonizante. Em 'Elefante', a pessoa com deficiência, os neurodivergentes, toda gente é admitida como público natural do projeto, independente da sua singularidade. Um solo de criação compartilhada, buscando uma cena criativa, inclusiva, de comunicação direta", afirma o ator e autor.

Eu falo de um doutor de artes cênicas, ou seja, falo de um homem apto a uma montagem teatral, cheio de cientificidade, que entende bem a linguagem que deve-se utilizar para chegar no seu público. Bingo! Porque é isso que procuramos quando levamos crianças ao teatro!

O "Elefante" é um espetáculo artesanal, construído com simplicidade e, ao mesmo tempo, com beleza e expertises inesperadas. Posso dizer que é um espetáculo apaixonante, inteligente, sedutor e muitas outras palavras.

Flávio é maravilhoso, um artista com excelentes movimentos, com comicidade, tudo com muito equilíbrio, além de risível. O artista concebeu uma obra plural, uma obra para todos! O espetáculo apresenta audiodescrição e também as libras nas mãos do artista no palco, uma graça!

Em um momento da peça, a orelha do elefante cai. Flávio faz disso um momento de risos, soube lidar com a situação muitíssimo bem. Para dizer a verdade, demasiadamente bem! Ele nos conduz a um momento tão nosso que a sensação é que estamos nessa manada com o ator. É como se estivéssemos em casa, uma sensação de estarmos juntos ali, ajudando-o naquele momento. Ele sintetiza isso no final da peça, tamanha verdade dessa sensação que tive. Um trabalho em conjunto!

O texto conta a saga do elefante que o personagem encontra na praia. Como ele foi parar naquela praia é o mote do espetáculo.

Diz o personagem que o elefante deixou a manada e seguiu à procura de descobertas, o que - cá entre nós -, faz essa história ser de todos nós. E assim foi o elefante, que primeiro atravessou a floresta.

A floresta era constituída com plantas artificiais e iluminação, um conjunto de sombras que resultam em uma obra graciosa. Lá na floresta, o elefante encontra um macaco, que chega mediante um retroprojetor, com cores pastéis que definiam uma belíssima imagem, lúdica, feita para crianças.

Saindo da Floresta, ele chega ao deserto. Mais uma vez, as sombras são realizadas através de papéis e o auxílio de um retroprojetor. As verdades do deserto são apresentadas, com direito a tempestades de areia.

Como se não bastasse, Flávio também mostra o elefante tomando banho, com uma chuva de água em torno do corpo.

O elefante chega a um penhasco. Como ele sai do penhasco? Encontrando um balão! Esse balão pertence a uma mulher e essa mulher dialoga com outras pessoas, mediante a desenhos na tela. Mais uma vez Flávio se mostra educacional: ele traz uma sociedade diversa, com pessoas negras também, o que penso ser outra afirmação importantíssima para a luta que travamos contra o racismo nos dias atuais.

E quando ele desce no balão, a plateia inteira suspira: ohhhhhhh!

Que coisa mais linda, ele desce mesmo em um balão!

A verdade, é que as crianças quebram a quarta parede. O tempo inteiro elas indagam, prestigiam e, mais que isso, suspiram suas emoções. Ouve-se o tempo inteiro: ele é engraçado! Eles ficam incontidos e isso é o mais importante: no teatro infantil não pode haver um silêncio sepulcral! Pelo amor de Deus, isso é algo que não combina com os pequenos.

O elefante pousa do balão em uma cidade, em uma selva de pedra, essa criada com uma maquete e mais uma vez a luz, que apresenta uma sombra PERFEITA!

Até que ele passa pelo carnaval da cidade e Flávio vira o elefante, com direito a confete e serpentina!

Até que o elefante encontra o mar, daí até o final da peça, a poesia chega!

A direção musical é uma delícia!

O que assisti estará em minha memória afetiva pela beleza que carrega. Um espetáculo montado para crianças que conquista o público adulto também. Sem dúvida nenhuma, vi uma obra para crianças, de fácil entendimento, vi um teatro artesanal, inteligente, plural, para todos! Há beleza na concepção do Flávio, há poesia, há acima de qualquer coisa entendimento da função do fazer teatro e, o mais importante, AMOR!

Eu jamais imaginaria que um espetáculo de um elefante apreciando o amor me alcançaria tanto!

É de sair apaixonado por esse artista, por essa obra tão delicada e capacitada. Pelo que se lê da ficha técnica desse espetáculo, há um olhar pedagógico e multidisciplinar que costura com ponto. É muito bem cerzida essa obra, a qual julgo como icônica para a acessibilidade e público-alvo. Não me prendo à suntuosidade cenográfica e figurinos hipnóticos, mas o que busco mesmo ao sentar em uma cadeira de teatro é a conexão!

Excelência é o que se fala?

Sinopse

Através de um rico jogo de sombras criadas por luzes, projetor e retroprojetor, Flavio Souza, sozinho em cena, cria um mundo de planícies, montanhas, oceanos e manadas de elefantes. Uma experiência lúdico-sensorial conduzida por um narrador – um curioso, um cientista ou um historiador – que investiga a viagem de um elefante que se separou de seu grupo em busca do sonho de conhecer o mar. A peça fala da importância de sonhar e desejar para encontrar seus próprios caminhos e produzir novos futuros. E da beleza a ser desvendada na singularidade e na diversidade.

Ficha Técnica

Criação e performance: Flavio Souza

Dramaturgia: Flavio Cafiero e Flavio Souza

Direção de Movimento: Denise Stutz

Direção Musical: Guilherme Miranda

Iluminação: Djalma Amaral

Cenário e Figurino: Flavio Souza

Diretor Assistente: Ricardo Rocha

Interlocução criativa e Pedagogia decolonial: Cléa Maria

Criação Multidisciplinar: Moira Braga

Dramaturgia: Flavio Cafiero

Consultorias em acessibilidade: Moira Braga, Bruna Gosling, Rosana Prado

Direção de Produção: Liliana Mont Serrat / Bloco Pi

Produção Executiva: Camille Aboud

Realização: Rainha Produções Artísticas LTDA

Serviço

ONDE: Espaço Cultural Municipal Sergio Porto Rua Visconde de Silva, s/n ao lado do nº 292, Humaitá / RJ

HORÁRIOS: sábados e domingos às 16h

INGRESSOS: R$30 e R$15 (meia)

DURAÇÃO: 50 min

FUNCIONAMENTO BILHETERIA: 1h antes do início do espetáculo

CAPACIDADE: 98 lugares

CLASS. INDICATIVA: livre e recomendada para a partir de 3 anos

ACESSIBILIDADE NO TEATRO: sim

TEMPORADA: até 30 de julho


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